Sunday 3 April 2016

RENEGADA - CATARINA TREBOADA





Eu som umha renegada
e na pescuda da verdade
hei berrar do alto dos telhados
Haverás me atopar
vadiando aló quanda o Cruzeiro Novo
ou parada e sentada no meu alpendre, descalça
abanando a cabeça
porque já abonda com tantos perdidinhos


Pro tu haverás me reconhecer
porque eu som ti, meu
Nunca é tarde demais
pra ver mais fundo da superfície
Acredita, há muito mais neste trelo
há um mundo além deste mundo
que se enfia raposeiro assi que amoucas
e tódalas tuas margens começam a cholucolear
É verdade
Um mundo que está a respirar
a soerguer os ombros e a chorar
sangrando por feridas abertas
É por isso que eu estou mancada
de gionlhos e a sentir
tudo o que estou a sentir

Já que logo, vem eiqui
dá acô essa mao
porque eu sei como pegar nela
Eu hei escrever a cada um de vós um poema
e a seguir pegar lume em todos eles
Porque eu fico abraiada
de ver como a luz nos teus olhos
semelha os céus brilantes
Meu, eu loitava mesmo pola tua vida
como se fosse a minha

Mas esta noite estou a escrever
tenho eiqui um tarro de vinho
e estou a enrolar charutos
na regueifa comigo mesma
coa gorja inçada
sentada à beira do rio
a ver a Santa Companha
a matinar no que sinto
cada vez que me apertas contra ti

Eu nom som carne, eu som toda energia
eu importo-me co gênio
tanto me tem a fama e as figuras
elas som apenas umha argalhada
pra queimardes

Mas endebém há mais
e eu sinto-o tam cru
a chamar-me pròs tempos dantes
É por isso que eu caminho através das paisagens
é por isso que eu termo dura no maico
até a mao me tremar
mas elas estám mais iluminadas ca os mações, meu

Eu estou eiqui com cara de ferreiro
coa tolémia mesmo ao pé de mim
mas eu nunca pestanejo
eu tenho tinta nas veias
Eu nom me importo coa superfície
importo-me co infinito
Eu esgaravelho um tobo e agocho-me dentro dele
eu me deito no quintal cos espíritos
pedindo perdom aos nossos anciaos
e eles dim-me, “cativa, cada minuto é o minuto pra começar elo
fai-no mais largo”
Mas o que me fai mais forte
tortura-me dum tal jeito ...

Meu,
a cada vez que as estações mudam
eu quedo completamente tomada

Prò caralho! Eu pego no leme
coma no punho dumha espada
eu som nada galega da leira
Eu som a segunda melhor regueifeira
que poucos ouvirom falar dela
A primeira, foi umha argalheira
e eu vou romper no cúmio aginha
Eu som-vos um velho espírito
mas mantenho umha mente nova
porque o Bleico amossou-me
que aqueles que nom se deixárom influir
ficam infinitamente abaixo dele

Portanto, se queres falar
vem procurar-me
Eu hei estar na Carreira do Luisgham
olhando prò abrente a derreter
Repara, eu costumava regueifar com estranhos quanda o trem
eu nom dava pegado em mim
eu tinha-che os miolos a arder
Eu adoitava moinar
cos bêbados nas bancadas da devesa
adoitavamos falar das vidas deles
diziam-me o porque abandonarem as mulheres
Meu, eu invadia os estrados sem convite
o entusiamo me vencia
eu tinha algo que dizer
e nom era quem de o conter
Pro mais tarde aprendim a acougar
e a ser rija e constante
e cada intre mesmo foi contando
e engadindo ao presente
e assi agora eu sem me alporizar acougo
e consulto a essência
e agradeço cada bençom

Pro repara, tudo é tam fisico eiqui
nom sabes, o bêbado na baiuca
enchendo o carrinho
até o mundo sumir ...
E eu deveço por algo sustentável
algo com verdade
algo introcável,
qualquer cousa coma ti, no teu quarto
namentres a choiva cai
e as fiestras estám-che abertas
e ela me borrifa na pele
coma o vento mareiro
Ti pra sempre podes-me amar
mas sem nunca precisar de mim
cagho-em-deola se nom eras ti
quem de me completar

Já que logo, esta é pròs romanticos sem cancelas
é pròs escangalhados, os abouxados
os puros, os cativos, os pedantes
os destemidos, os amoucados
a viverem no bandulho da besta
coas ratazanas e os rançosos
e as canelhas encobertas
e nós a morrermos de fame enquanto eles folgam e pandegam  
mas Banquo há-se erguer  
ele tem umha message pròs culpados
Esta é-vos pròs que trabalham que nem galegos
os sujos, os baldréus
Esta é-vos prà cida’ que me fixo
e que há me derrubar
se eu nom aprender a direito
Eu som lume que brila
numha piscadela de olhos
eu torno o poder em fraqueza
Imós aló entom, força
vem ao bar quanda mim
eu hei erguer a cunca ao céu
e amossar-che que ti és o caralho vintetrês

Escoita, nós nom somos carne
nós somos todo energia
eu importo-me co génio
tanto che-me tem a fama
tanto me tem os louvores
eu importo-me e coa integridade
porque as figuras  as construídes
pra, afinal, lhes queimardes a imagem
E eu estou-me achegando mais e mais
à minha essencia, a cada vegada ...

Renegada